Crônica: Logoterapia, por Celina Fleig Mayer
Alguns anos atrás, uma amiga comentava que sua tia estava doente e nenhum médico acertava o diagnóstico. Primeiro tinha percorrido vários especialistas, pois vinha perdendo peso e andava desinteressada de tudo. Até dos jogos de boliche que disputava com as amigas, em tardes previamente marcadas, onde havia também chá e diversão, ela se ausentara. Por causa disso, além da família, havia mais gente querendo saber qual era o problema dela.
Certo dia, um dos últimos médicos consultados, escreveu num receituário azul, uma fórmula controlada, e mandou-a tomar um comprimido pela manhã e outro à noite, antes de dormir. Parece que ajudou. Em pouco tempo, a tia da minha amiga voltou à normalidade. E ao grupo de boliche, que a acolheu com mais atenção do que antes, fazendo com que ela se sentisse querida e importante para sua turma. Foi, na verdade, o melhor remédio...
Ninguém tinha se dado conta. Ela completara 60 anos quando os sintomas apareceram. A doença poderia ser chamada de “depressão da terceira idade”. O médico nem falou em terapia, estava fazendo uma experiência com a medicação. E, ele não acreditava que algum trauma da infância ou da idade adulta estivesse incomodando a mulher. Freud não servia para ela, nem para qualquer pessoa com esses sintomas e nessa idade, só por se desinteressar de tudo. Imaginemos, então, alguém depressivo aos oitenta anos, numa terapia tradicional, discutindo sua relação com o pai (lá no passado!) ou assuntos sexuais bem longínquos com um terapeuta freudiano. O que ajudou essa paciente foi o fato de pertencer a um grupo que a queria bem.
Um médico austríaco Viktor Frankl, diante de questões assim, tornou-se dissidente da psicanálise convencional, e criou a logoterapia. Essa especialidade ainda é pouco difundida no Brasil, infelizmente. Porque, não foi apenas esse caso da tia da minha amiga que eu soube, na mesma época, dos meus trinta e poucos anos. Todas as mães e tias e avós que conheci ao longo da infância e juventude, garanto que estavam com sintomas semelhantes, embora a maioria jamais tenha revelado seu sofrimento. Nós, os jovens da época, não sabíamos o que era chegar – querendo viver muito, mas não envelhecer – aos 60 anos. Todo mundo está ficando mais tempo aqui, vivendo mais, e o Brasil, um país de, até então, jovens, não sabe o que fazer com seus idosos, quando ficam infelizes. E, os idosos de agora, por sua vez, não estão sabendo o que fazer com suas “perdas”: juventude, pique, produtividade...
Mas, voltando ao médico austríaco e seu tratamento para idosos depressivos, ele diz que é preciso que a pessoa da terceira idade encontre um sentido para a vida. E isso é possível, através de três maneiras: 1. criando um trabalho ou fazendo uma ação;2. encontrando alguém (amor); 3.ou encarando o sofrimento com dignidade.
Pesquisas já apontaram que o idoso que encontrou um sentido para sua vida teve um impacto positivo na sua saúde. Além de viver mais tempo, o mesmo benefício foi constatado contra doenças como Alzheimer, cardíacas e depressão.
E, vale lembrar que, pela criação da logoterapia, o médico austríaco já recebeu 27 títulos de doutor Honoris Causa. Aqui no RS, a UFRGS e A PUCRS outorgaram-lhe essa distinção. Isso nos causa muita satisfação!
Tomara que não precisemos dessa terapia, mas eu e um grupo grande de conhecidos, colegas de trabalho, amigos do meu tempo, esperamos que o número de logoterapeutas se propague. Porque somos pacientes em potencial, e não estamos a fim de contar sobre nossos traumas passados. Queremos é aprender a viver melhor o desconhecido tempo futuro...
*Celina Mayer é jornalista: [email protected]