Crônica: A forquilha, por Máximo José Trevisan

  Uma noite destas, vi na tevê uma reportagem que focalizava um típico cearense do interior. Falava da importância da forquilha como meio para descobrir água no sertão. O homem era do time que mata a cobra e mostra o pau: pegou o seu facão, embrenhou-se no mato, cortou uma forquilha e partiu para a demonstração. A emoção fez ressurgir o menino que eu era ao tempo em que estive interno no antigo Pré-Seminário, em Faxinal do Soturno. Lá já havia presenciado situação semelhante à que estava vendo na tevê, protagonizada por um gaúcho-gringo, homem simples como o cearense. Ele tem o dom e o poder de descobrir água, todos diziam. Isso ficou guardado na minha memória. Neste momento, espanada a poeira do tempo, tudo surgiu tão nítido na minha memória! Era verdade: forquilha nas mãos, o gringo caminhava em busca da água dentro da terra árida. De repente, o sinal da terra a ser cavada, o poço nascia do trabalho coletivo, e a vida, que só a água traz, surgia como notícia alvissareira. Agora, com a tevê, descubro que o uso da forquilha para encontrar água já era costume na antiga Roma, e isso se deve à  radioestesia. Imitando Arlindo Castegnaro, inesquecível amigo e sogro, fui ao Aurélio, e lá estava a palavra radioestesia – sensibilidade às radiações. Pronto, uma explicação científica é capaz, num instante, de tirar o mistério e a magia que fazem do cearense e do gaúcho-gringo uns mágicos!... Resisti e fiquei com o mistério e a magia, deixando de lado a ciência. Valorizei a generosidade do cearense, que colocava o seu dom e trabalho a serviço da comunidade. Não cobro nada, disse ele ao repórter da TV Globo, porque fico feliz quando os vizinhos começam a ter água em casa. Relembrei o tempo vivido em Faxinal do Soturno, quando o Euzébio Busanello,  num dia de forte chuva, me levou na sua camioneta a Dona Francisca para arrumar o meu braço, que acabara de quebrar num jogo de estafeta. O Raio-X do hospital também era uma espécie de forquilha para descobrir o que não via e informar ao médico onde estava o problema ou a solução. Era o sentido da palavra radioestesia! Tudo aparentemente muito simples, mas, no fundo, tudo essencialmente complexo, cheio de significados como a vida. Comecei a pensar em como seria o mundo se tivéssemos uma forquilha para descobrir a boa água nos corações humanos. Ouviríamos até a voz interior à semelhança do índio que encosta no chão o ouvido para “ver” quem vem ao longe. Cavaríamos, com diligência, um poço e apanharíamos, com a palma da mão, a melhor água. Voltaríamos sempre com o balde da paixão, para enchê-lo com a água do amor, para hidratar a terra seca pelo ódio, pela vaidade, pela inveja, pela mediocridade. Não precisaríamos de mais nada, pois teríamos, simplesmente, o essencial, o suficiente, o necessário de amor, ternura e carícia para as nossas carências. O mundo assim seria diferente, mais poético, prazeroso, mágico, mais humano.

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