Crônica: A Justiça ao longo do tempo..., da professora Eloisa Antunes Maciel
[caption id="attachment_4670" align="aligncenter" width="450"] Reprodução internet[/caption]
Desde os tempos das cavernas, o homem primitivo a si atribuía o direito de “fazer’ sua própria justiça, sendo seu conceito de justiça intuitivamente concebido. E, sob essa ótica, ao praticar o que julgava ser o seu direito inabalável, cometia atos de caráter ultra arbitrário, como o de abater supostos invasores de seus presumidos domínios, eliminado-os sumariamente, sem considerar critérios que viessem a caracterizar a alegada invasão... Essa prática teria se estendido até à Idade Média, ao longo da qual prevalecera a “justiça” praticada por nobres proprietários de terras ou pelos ditos senhores feudais...
No entanto, essa pretensa justiça já fora intensivamente praticada desde a Antiguidade, haja vista a denominada “Lei de Talião” – viabilizada através da cognominada pena de Talião e explicitada através da expressão “olho por olho, dente por dente”... Em se tratando de invasões, esse refrão seria expresso da seguinte forma: invadiu, será invadido...
Na atualidade, em termos de linguagem popular, esse adágio seria traduzido pelo surrado chavão: “bateu, levou” ou “matou, morreu”... E, obviamente, a danosa motivação dessa prática já subentendia o desejo de vingança, cuja manifestação se constituía uma antinomia da verdadeira justiça...
Há que convir-se, ainda, que muitas mais dessas práticas primitivas talvez tenham tido origem em incriminações falsas, alegações infundadas, distorções, entre outras aberrações que culminavam por invalidar o verdadeiro sentido da justiça, resultando em execução sumária de inocentes, embora alguns pensadores romanos já tivessem esboçado a intenção de dimensionar adequadamente o seu conceito justitia, a partir da tentativa de desvelamento do véu de Themis, herdada dos gregos através da interação histórica.
No plano de questões subjetivas, passagens bíblicas tendem a mencionar o arbitramento de atos de justiça por parte de sábios, reis, sacerdotes ou representantes de determinadas castas ou estamentos, como o de anciões, cortes religiosas, entre outros detentores do poder de julgar e decidir questões no plano subjetivo.
A mediação do Rei Salomão, frente à disputa de uma criança por duas mulheres, seria um exemplo emblemático de arbitramento caracterizado pela “boa astúcia”, remota precursora de alguns recursos ainda empregados, até mesmo em alguns tribunais da Pós-Modernidade...
A seu turno, a Idade Moderna teria inaugurado um novo paradigma sob o qual, fatidicamente (e ao extremo) redimensionava a Pena de Talião – e com requintes de crueldade...
Reis, rainhas e outros “condenados” foram cruelmente guilhotinados, sem que, em determinadas situações, fossem materialmente comprovados os crimes que lhes eram imputados.
E (diga-se): essas execuções se processavam sob um lema paradoxalmente fascinante: “Liberdade, Igualdade, Fraternidade”... (Talvez o termo mais questionável desse lema tenha a ver com o emprego da palavra fraternidade, em se tratando de sua inclusão num contexto em que se consumaram cruéis execuções de seres humanos...).
Ironicamente, em pleno apogeu da dita Pós - Modernidade, em nome da Justiça, foram (e ainda são) adotados meios cruéis de execução, sendo que, em determinados países orientais, ainda prevalecem práticas primitivas de “justiçamento”, tais com lapidação, enforcamento e execuções por fuzilamento, entre outras modalidades cruéis, enquanto no Ocidente, em que pesem todos os avanços no plano jurídico, a cadeira elétrica foi adotada (e ainda é cogitada), evidenciando marcante aberração em época de propalada defesa dos direitos à vida... E, diga-se, essa prática foi instaurada e mantida num país cuja maioria se diz praticante dos princípios cristãos e adepta da teoria dos Direitos humanos...
E embora reconhecidos os autênticos avanços a partir da Modernidade, atualmente o slogan Suma justitia, suma injuria tem sido alegado como advertência aos possíveis descalabros em julgamentos e execuções que venham a decorrer daqueles.
O alerta parece claro: o exagero em nome de uma pretensa justiça poderá redundar em injustiça e seus deploráveis desmembramentos...
Entretanto, também na atualidade, instituições e movimentos (culturais, artísticos, humanitários, entre outros) tem – se dedicado a elucidar e propalar fundamentos da justiça enquanto apanágio do ser genuinamente humano, clamando por consideração a esses fundamentos à prática de uma autêntica justiça, primando por destacar os imperativos de Paz e da Fraternidade como elementos capazes de fornecer subsídios à denominada justiça social e, por extensão, a uma justiça universal que verdadeiramente venha a fazer jus ao verdadeiro sentido de uma verdadeira justiça...
* Eloisa Antunes Maciel é associada da APUSM e Professora aposentada da UFSM*